Suponha que você já conversou bastante com várias pessoas sobre a ideia de sua startup e chegou a um projeto inovador e promissor. Se você acha que está na hora de fazer seu plano de negócio, está enganado: quando você terminá-lo, pode ser tarde demais.
Entenda por que o modelo de negócio é mais importante nas startups que o plano de negócios tradicional, e como evoluir sua ideia em direção a um modelo escalável e repetível.
Modelos são simples e rápidos de entender
Planos de negócio são usados há séculos para detalhar como uma empresa pretende atingir suas metas e criar valor, e sempre foram usados no processo de obtenção de investimento. Somente no século XX, com o aumento das empresas de capital aberto, passou a ser usada a expressão ‘modelo de negócio’: ela explicitava como a empresa convertia produto em valor, e assim era possível estudar como tornar seu fluxo de capital mais eficiente. Veja alguns exemplos de modelos tradicionais de negócio:
– o modelo de franquias, onde um empreendedor paga uma taxa para usar em seu favor uma marca e processos comerciais já consolidados.
– o modelo de recarga, como o dos celulares pré-pagos e impressoras: o equipamento é somente um meio para se obter uma receita recorrente, seja em créditos de celular ou na compra de toners e cartuchos de tinta.
– o modelo de classificados, em que usa-se um meio impresso ou digital para mostrar anúncios, e o cliente paga proporcionalmente ao destaque que deseja.
– o modelo de assinatura, usado tanto por jornais e revistas quanto TV: garante-se a receita previamente ao vender informação em pacotes, dando um desconto para seu consumo repetido.
Para entender um plano de negócios, precisa-se de algumas horas lendo um documento de 20 a 40 páginas. Para entender um modelo de negócios, precisa-se de no máximo alguns minutos – e somente se ele for muito complexo. Quem vende, quem compra, por que e como se paga por isso – tudo fica claro. Parece fácil até agora, porque você está acostumado com modelos tradicionais.
A diferença é que as startups realmente promissoras fazem uma entre duas coisas: ou reinventam um modelo tradicional e o atualizam para um contexto muito diferente, ou inventam um modelo totalmente novo.
Problema e solução desconhecidos
Estamos acostumados com problemas que são nossos velhos conhecidos, e com muitas soluções já mapeadas. Quer ver um exemplo simples? Pessoas que têm cachorros em casa e precisam viajar, mas não têm parentes ou amigos na cidade. No início, elas pediam ajuda ao vizinho. Com o tempo, vieram os tomadores-de-conta profissionais, e alguns perceberam que poderiam ganhar mais dinheiro se criassem hotéis para cachorros e abrirem pet-shops para captarem seus clientes. Essas soluções foram sendo gradualmente melhoradas para serem mais profissionais, terem mais qualidade e obviamente ganharem mais dinheiro. Transponha isso para qualquer outro contexto de produto e serviço, e você será capaz de encontrar exemplos similares.
O holandês Alex Osterwalder se juntou a outros especialistas e criou o livro “Business Model Generation“, (disponível em Inglês e Português). O livro, hoje uma referência obrigatória para a modelos de negócio, traz exemplos que vão do iPod da Apple até o Nintendo Wii e Cirque du Soleil, mostrando os blocos que formam um modelo de sucesso. Osterwalder define 9 itens indispensáveis para um modelo de negócio:
– a sua proposição de valor: o que você oferece que é único no mercado?
– os segmentos de clientes: quem é o cliente final?
– suas atividades chave: o que exatamente você realiza, e que irá consistir no produto ou serviço ofertado?
– suas parcerias estratégicas: que empresas ajudarão a compor melhor essa oferta?
– suas fontes de receita: como você cobra, e quais são os drivers de receita?
– sua estrutura de custos: quais drivers são geradores de custos?
– os recursos principais: qual a infra-estrutura, recursos ou serviços de base?
– os canais de comunicação e distribuição: como o produto chega até o cliente?
– o relacionamento com o cliente: como a empresa e marca se comunicam com ele?
Se você é um empreendedor aplicado, pare de ler esse artigo, compre o livro e volte em seguida.
Mesmo após ler o livro e se tornar um especialista em modelo de negócio, existe um problema: ao se criar uma startup, procura-se por uma inovação uma solução desconhecida para um problema muitas vezes também desconhecido (ou que não podem ser descritos com clareza). Por isso, os métodos tão conhecidos de pesquisa de mercado, grupos de foco e outras práticas não são aplicáveis: é preciso ser mais ágil, mais flexível e mais produtivo.
Um professor da Universidade de Stanford percebeu isso e inventou um método para startups tentarem acelerar seu sucesso. Steve Blank diz que nenhum plano de negócios sobrevive ao primeiro contato com um cliente, e que enquanto planos são estáticos, modelos de negócio são totalmente dinâmicos. Em seu livro “Four Steps to Epiphany”, ele afirma que além do tradicional processo de desenvolvimento de produtos, é importante também dominar o processo de desenvolvimento de clientes – desde a descoberta (lembre-se: se o problema e solução são desconhecidos, como definir quem é o cliente?) até sua validação e aquisição. A proposta é que o empreendedor faça várias rodadas de avaliação do seu modelo, sempre validando-o junto ao cliente e revendo suas premissas iniciais – e veremos isso com mais detalhes nas próximas semanas.
Como você vê, encontrar um modelo de negócio escalável está mais próximo de uma arte, experimentação e de momentos geniais de iluminação do que a mera aplicação dos métodos tradicionais de gestão de empresas. Acostume-se com isso: startups são um bicho totalmente diferente… E como ele está em constante reinvenção, a hora certa para fazer seu plano de negócios é quando você for obrigado por um sócio, investidor ou fonte de fomento, como FINEP ou Fapesp. Até lá, o que você precisa é iterar diversas vezes, procurando modelos de negócio com potencial de escalabilidade e geração de valor. E rápido.
4 Comments on "Qual é a hora certa de fazer um plano de negócios?"
André Giannetti
19/02/2013Querido Yuri, ótimo texto!
O seu amigo holandês Alex Osterwalder investiu em um projeto de compartilhar sonhos bem semelhante ao do Dreamsgram. (www.everest.com) O Peter Thiel também está nessa, ou seja, estamos no caminho certo. Pelo amor que vc tem a startups, nos ajuda!!!?
Postei um novo sonho lá no apps.facebook.com/dreamsgram e te adicionei! :)
Yuri Gitahy
19/02/2013Fala André :) É como eu sempre digo, o negócio é fazer o sonho virar realidade antes, e só assim a gente tem a prova de que o projeto é mais que um sonho. Infelizmente a gente corre o risco de perder excelentes investimentos, mas é a forma como conseguimos operar :)
Gabriel
20/02/2013O proposto pelo BMG é muito interessante, mas acredito que acabou por dar impulso na "bolha de empreendedores" que o Yuri já comentou em outro artigo.
É muito simples preencher um canvas; qualquer um hoje preenche um canvas e começa a procurar capital.
Criar um plano de negócios completo exige muito mais tempo, pesquisa e dedicação, o que, na realidade, afasta a maioria dos "interesseiros". Digo isso, mas não afirmou que tem de escolher-se o plano de negócios invés do modelo de negócio ou vice-versa.
Para avaliar minhas idéias uso um mix dos dois; faço um canvas, e um pequeno roteiro de como funcionarão as atividades e uma pequena simulação financeira.
Um pouco off-topic; Yuri, o que você pensa a respeito da "nacionalização" de idéias estrangeiras? Existem várias idéias muito interessantes ao redor do mundo, mas que ainda não foram implantadas no Brasil (lógico que deve-se analisar a viabilidade). Você vê com bons olhos um empreendedor que vê uma idéia interessante em outro país e a adapta para faze-la funcionar aqui?
Yuri Gitahy
20/02/2013Tá na mão: http://aceleradora.net/2010/03/09/startups-brasileiras-podem-ate-copiar-mas-evoluam/