Na parte 3 da nossa série, você aprendeu que em muitas vezes o valuation das empresas é baseado em um “chute”. Mesmo assim, existe um método simples e um pouco mais interessante – apesar de ainda impreciso – para definir o valor da sua startup.

Relembrando, essa série de posts simplifica muitos conceitos para facilitar seu entendimento e mapeá-los à realidade das startups e empreendedores brasileiros. Fique à vontade para deixar seu comentário caso ele ajude a melhorar esse entendimento.

Método 2 – Referência

O método da Referência é simples de entender, mas raramente conseguirá ser aplicado à risca. É quando sua startup se mapeia em um negócio similar no mercado, em uma situação similar à sua e que recebeu um aporte recente.

Por exemplo, o aporte divulgado de R$ 17 milhões do ClickOn (independente do percentual que ele compra da empresa, e do valuation estar correto ou não) permite aos sócios do CityBest abordarem investidores com um pouco mais de fundamento, reduzindo (mas não eliminando) a chance de terem o método do Chute usado contra eles.

Negociação de exemplo
Investidor: Estamos realmente interessados em comprar entre 20% e 30% de sua empresa. Vocês já entraram em acordo sobre o valuation?
Empreendedor: Sim.
Investidor: E quanto seria?
Empreendedor: Nós fomos bem criteriosos ao procurar referências para nosso valuation. O que encontramos nos deixou bastante seguros, e aceitamos a compra 30% da empresa por R$ 600 mil investidos em três partes ao longo dos próximos 18 meses.
Investidor: Um valuation de quase 2 milhões? Mas vocês ainda não têm receita, e seu modelo não é comprovadamente viável.
Empreendedor: Concordamos, mas estamos confiantes porque o mercado de VCs está interessado nesse tipo de modelo – já conversamos com alguns investidores para confirmar isso. Sabemos por exemplo que há 8 meses a empresa X que possui um modelo similar ao nosso recebeu um aporte de R$ 1,5 milhões por um percentual que sabemos ser menor que 50%.
Investidor: Mas isso não comprova nada…
Empreendedor: Também pensamos isso por um tempo, quando há 3 meses a empresa Y recebeu um valor até maior por um percentual similar – e ambas ainda não estão com tração suficiente no mercado para impedirem um novo entrante. Se você ouvir nossos diferenciais, como vocês podem contribuir para a estratégia e por que achamos que conseguimos vencer a concorrência, com certeza nosso valuation vai parecer mais fundamentado.

O investidor pode retrucar com “ok, mas o valuation da empresa X ou Y está incorreto e com certeza super-dimensionado”. Mesmo assim, existe um estudo prévio e isso supera de longe a falta de objetividade do método do Chute. O empreendedor ganhou tempo, um pouco mais de confiança e um “ok, por que não? Vamos ver isso melhor.”

Analisando o método da Referência

Ao comparar esse diálogo com o visto no post anterior, percebe-se uma mudança clara de postura. Enquanto no anterior o tom era “achamos que é isso”, no diálogo acima é possível notar uma fundamentação mais confiante do empreendedor. Isso vem de experiência, prática e diversas conversas que terminaram com um “sai daqui menino”…

Uma segunda perspectiva pode ser aplicada nesse método, na falta de um caso similar ao seu no mercado. Se isso acontecer, não compare modelos que não são similares: use a referência de valuation que vários investidores dão a você, independente do método. Como usar a “auto-referência” então, mesmo que baseada no Chute?

Imagine que os empreendedores já conseguiram que o investidor acima aceite um valuation de R$ 2 milhões para sua startup. Caso eles não tenham assinado um acordo de exclusividade (o que os impediria de mostrar seu projeto a outros investidores enquanto negociam com o primeiro), os empreendedores decidem então viajar por alguns dias, marcando reuniões com diversos fundos e investidores conseguidos através do seu networking.

Na reunião seguinte, eles podem tentar defender um valor maior – por exemplo, de R$ 3 milhões – que veio a partir do seu cenário realista. Como plano B, topam aceitar um valuation de R$ 1.5 milhões de acordo com o cenário pessimista. Como carta na manga, eles têm uma proposta do investidor que acabou de aceitar um valuation de R$ 2 milhões.

Se o segundo investidor consultado usar o método do Chute para um valuation abaixo disso, basta os sócios citarem: “Temos uma proposta real de valuation de R$ 2 milhões. Caso você não queira reconsiderar, agradecemos seu tempo.”

Se após bastante conversa a resposta for “Ok, aceitamos um valuation de R$ 2.2 milhões” ou qualquer valor acima disso, eles podem tentar ir até o próximo investidor e apresentar o novo valor como referência. Assim, o melhor valuation será conseguido após exercitar diferentes negociações com base em diferentes ofertas de valuation pelos investidores.

Essa estratégia nem sempre é possível, pois é difícil protelar a negociação com um investidor enquanto se fala com outros (ou seja, é difícil passar sem um acordo de exclusividade por pelo menos algum tempo). Ou a startup não tem pressa para fechar o aporte, ou então já tem uma agenda cuidadosamente sincronizada para coletar as propostas de muitos investidores interessados em um período muito curto de tempo (por exemplo, entre 1 e 2 semanas).

Concluindo, mais uma vez nota-se que o valuation não é a única preocupação do empreendedor ao tentar um aporte. Até aqui, no modelo de precificação por referência, deve existir um estudo detalhado ao redor do valuation incluindo o modelo de negócio, a busca de empresas similares, um estudo mínimo de marketing… E ao final disso, o empreendedor irá perceber que ele pode ganhar tudo isso se tentar passar algumas horas brincando com algo que pareça um plano de negócios.

No próximo post da série, vamos falar sobre mais um método aproximado de valuation: as técnicas de múltiplos.

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