Na parte 2 dessa série, você aprendeu um pouco sobre quando e por que o valuation é útil. Agora é hora de entender mais sobre como quantificar o valor de sua startup.

Esse post e os próximos têm uma premissa importante: os métodos de valuation aplicáveis a empresas de mercado foram muito simplificados e reduzidos para serem apresentados. Além de facilitar seu entendimento, essa simplificação os mapeia mais facilmente à realidade das startups e empreendedores brasileiros. Por isso, se você for experiente com métodos de valuation, se sentirá tentado a apontar erros nos modelos… Segure-se. Se quiser sugerir melhorias ou analogias, manifeste-se à vontade. Para qualquer um aprender de verdade sobre esse tema, sugiro de duas a três leituras do livro “Investment Valuation” de Aswath Damodaran.

O primeiro é bem fácil de entender, e infelizmente é mais usado do que deveria.

Método 1 – O Chute

Esse é o pior de todos os métodos, pois ele é baseado simplesmente na sua estimativa – ou pior, a do seu potencial investidor. Existem dois diálogos possíveis ao usar esse método:

Situação 1 – O Chute do Empreendedor
Investidor: Caros, estamos realmente interessados em comprar entre 20% e 30% de sua empresa. Vocês já entraram em acordo sobre o valuation?
Empreendedor 1: Sim.
Investidor: E quanto seria?
Empreendedor 1: Dezessete.
Investidor: Mil?!?! Pelos 20%?
Empreendedor 2: Milhões.
Investidor: De reais… certo?
Empreendedor 1 e 2: Não, dólares (em uníssono). De valuation.
Investidor: De onde vocês tiraram esse valor?
Empreendedor 1: De nossas estimativas e cálculos.
Investidor: Podemos consultar essas estimativas?
Empreendedor 2: Não.
Investidor: Entendo… (longa pausa)

Na situação 1, mesmo que você dê muita sorte e seu chute seja certeiro, o investidor vai jogar seu valor para baixo.

Situação 2 – O Chute do Investidor
Investidor: Nossa proposta é pagar R$ 100 mil por 20% de sua empresa.
Empreendedor 1: Isso coloca nosso valuation em R$ 500 mil!
Investidor: Na mosca.
Empreendedor 2: Mas é muito pouco!
Investidor: É? Não acho, sempre investimos essa quantia por esse percentual.
Empreendedor 2: No nosso exercício do valuation, chegamos a 1.5 milhões no cenário pessimista e 3 milhões no realista.
Investidor: De reais… certo?
Empreendedor 1 e 2: Não, dólares! (em uníssono)
Investidor: Ok, aceitamos subir um pouco. R$ 130 mil por 20%, é pegar ou largar. Temos outras startups para avaliar.

Caindo na situação 2, os empreendedores ao menos têm base para barganhar – e quanto mais fundamentada for a projeção e argumentos, melhor a margem de negociação. Afinal, eles exercitaram o valuation antes…

Analisando o Chute

O único ponto a favor desse método é a facilidade de dar o chute. Os contras são vários… E se você fez seu trabalho de casa direito, aprendeu que antes de negociar investimento é melhor ter alguma receita – por menor que seja, mas provando que existe um mercado potencial. Encare isso como chutar com um pé firme no chão, sabendo onde quer chutar e tendo uma base para direcionar melhor seu esforço.


Claro, você pode preferir fazer diferente.

Na parte 2 desta série de posts, o empreendedor e mentor da Aceleradora Eric Santos argumentou que “como um consultor de fusões me falou uma vez, valuation em startups é simples. O empreendedor quer pedir uma coisa, o investidor está disposto a dar outra (dado que gostou da empresa), e aí começa a ‘masturbação mental’ na planilha para que se chegue junto a um meio-termo lógico que atenda aos dois e que eventualmente possa se justificar a terceiros.”

Perceba que essa barganha é um processo de negociação que sempre vai existir, seja o valuation realista ou chutado… Mas uma coisa é quanto sua startup vale, a outra é quanto você está disposto a receber considerando o quanto querem pagar (tratamos disso na parte 1). Se os empreendedores pararem de colocar seu foco no dinheiro e o direcionarem com a auto-crítica que irá transformar seu projeto em um negócio escalável, podem perceber que não precisam tanto do dinheiro nesse primeiro momento.

Pense comigo: é esse investidor retratado pelo Eric (e fiel à realidade) que você procura e que espera ter ao seu lado como sócio? Alguém que detém o poder de ter mais dinheiro que você, e que pressiona você para aceitar um acordo baseado em um chute? Por outro lado, você quer ser a pessoa que empurra um valor totalmente subjetivo para tentar extrair o máximo de dinheiro de alguém? Em um projeto sem prova nenhuma de que pode funcionar? Sem uma pesquisa confiável, sem clientes já comprometidos e aguardando para comprar seu produto? Sem isso, como você vai pagar o investimento feito? Em outras palavras: você é bom o suficiente para acertar um chute, mesmo que aparentemente ele comece perdido?

Sim, eu já concordei com o Eric nos comentários: em um mercado imaturo como o nosso, a realidade é essa. Em mercados mais maduros, é provável que o investidor-anjo ache que a startup vale até mais do que o próprio empreendedor. Só que os investidores-anjo brasileiros são poucos, têm uma aversão moderada a riscos e reclamam constantemente (até com razão!) que os empreendedores não têm noções de gestão… Perceba então que se o empreendedor brasileiro optar por um valuation totalmente no chute e pela barganha pura e simples, sem uma base concreta que a fundamente… somente irá perpetuar essa percepção ruim do investidor sobre ele.

O aprendizado que vem do processo de análise – do que deve ou não ser levado em conta no valuation – é uma das coisas que poderá mudar esse paradigma no mercado brasileiro. Faça sua parte.

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